Home Direitos Humanos LEI Nº 14.821, DE 16 DE JANEIRO DE 2024

LEI Nº 14.821, DE 16 DE JANEIRO DE 2024

136

LEI Nº 14.821, DE 16 DE JANEIRO DE 2024
Institui a Política Nacional de Trabalho Digno e Cidadania para a População em Situação de Rua (PNTC PopRua).

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º É instituída a Política Nacional de Trabalho Digno e Cidadania para a População em Situação de Rua (PNTC PopRua), destinada a promover os direitos humanos de pessoas em situação de rua ao trabalho, à renda, à qualificação profissional e à elevação da escolaridade.

Parágrafo único. Para fins desta Lei, considera-se população em situação de rua o grupo populacional heterogêneo que tem em comum a falta de moradia e utiliza os logradouros públicos como espaço de moradia e de sustento, bem como as unidades de acolhimento institucional para pernoite eventual ou provisório, podendo tal condição estar associada a outras vulnerabilidades como a pobreza e os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados.

Art. 2º São princípios da PNTC PopRua:

I – respeito à dignidade da pessoa humana;

II – valorização e respeito à vida e à cidadania;

III – estabelecimento de condições de trabalho decente;

IV – articulação entre trabalho, educação e desenvolvimento;

V – sustentabilidade ambiental;

VI – atendimento humanizado e universalizado;

VII – participação e controle sociais;

VIII – direito à convivência familiar e busca da inserção comunitária;

IX – transparência na execução dos programas e ações e na aplicação dos recursos a ela destinados;

X – respeito às condições sociais e às diferenças de origem, de raça, de idade, de nacionalidade e de religião, com atenção especial às pessoas com deficiência ou com comorbidades e às famílias monoparentais com crianças;

XI – promoção de igualdade de oportunidades e não discriminação.

Art. 3º São diretrizes da PNTC PopRua:

I – oferta de condições de autonomia financeira e de enfrentamento da pobreza, por meio de programas redistributivos, de elevação da escolaridade, de qualificação profissional e de promoção do acesso amplo, seguro e simplificado ao trabalho e à renda;

II – consideração da heterogeneidade da população de rua, notadamente quanto ao nível de escolaridade, às condições de saúde, à faixa etária, à origem e às relações com o trabalho e com a família;

III – fomento de ações de enfrentamento do preconceito, da discriminação e da violência contra pessoas em situação de rua no ambiente de trabalho;

IV – garantia, no acesso ao trabalho e à renda, de transversalidade e de articulação territorial com outras políticas públicas setoriais, de áreas como saúde, assistência social e habitação;

V – relação entre trabalho e moradia, com adoção de estratégias que tenham como centralidade o acesso imediato da população em situação de rua à moradia como forma de garantir inserção sustentável no mundo do trabalho;

VI – respeito às singularidades de cada território, inclusive das comunidades tradicionais nele presentes, e ao aproveitamento das potencialidades e dos recursos locais na elaboração, na execução, no acompanhamento e no monitoramento dos instrumentos de políticas públicas previstos na PNTC PopRua;

VII – fortalecimento e estímulo ao associativismo, ao cooperativismo e à autogestão de empreendimentos de economia solidária de pessoas em situação de rua;

VIII – o trabalho como possível ferramenta para a redução de danos, inclusive os associados ao uso problemático de álcool e outras drogas, desde que respeitada a autodeterminação das pessoas em situação de rua;

IX – articulação de ações que possibilitem a superação da situação de rua;

X – integração dos esforços do poder público e da sociedade civil para elaboração, para execução e para monitoramento das iniciativas previstas nesta Lei;

XI – responsabilidade do poder público pela sua elaboração e financiamento.

Art. 4º Para atingir suas finalidades, a PNTC PopRua será organizada com base nos seguintes eixos estratégicos:

I – incentivos à geração de empregos e à contratação de pessoas em situação de rua;

II – iniciativas de fomento e de apoio à permanência para qualificação profissional e elevação da escolaridade;

III – facilitação do acesso à renda e incentivo ao associativismo e ao empreendedorismo solidário, por meio de implantação de política nacional e desburocratizada de acesso ao microcrédito.

Art. 5º A PNTC PopRua deverá instituir mecanismos que garantam os direitos da população em situação de rua, por meio da criação de incentivos à sua contratação, na forma desta Lei, sem prejuízo de outras legislações específicas, bem como fomentar a produção de circuitos de economia solidária.

§ 1º A União, por meio do Poder Executivo federal, e os demais entes federativos poderão firmar convênios com entidades públicas e privadas sem fins lucrativos para o desenvolvimento e a execução de projetos que beneficiem a população em situação de rua e estejam de acordo com os princípios, as diretrizes e os objetivos que orientam a PNTC PopRua.

§ 2º A contratação de pessoas em situação de rua deverá respeitar a legislação trabalhista e previdenciária, especialmente a proibição, em qualquer hipótese, da remuneração por diária de trabalho abaixo do mínimo definido pelas convenções coletivas de trabalho, bem como o devido fornecimento, quando necessário, de equipamentos de proteção individual.

Art. 6º O poder público, em todas as esferas federativas que aderirem à PNTC PopRua, deverá instituir rede de Centros de Apoio ao Trabalhador em Situação de Rua (CatRua) com o objetivo de prestar atendimento às pessoas em situação de rua que buscam orientação profissional e inserção no mercado de trabalho.

§ 1º Os CatRua serão as unidades territoriais básicas de implementação da PNTC PopRua, responsáveis por articular as ações de empregabilidade, de qualificação profissional, de economia solidária e de integração intersetorial com as demais políticas públicas.

§ 2º Nas unidades federativas onde existirem equipamentos públicos que garantam apoio aos trabalhadores, os CatRua deverão ser integrados à sua estrutura, desde que observadas as diretrizes previstas nesta Lei.

Art. 7º São atribuições dos CatRua, sem prejuízo de regulamentação posterior:

I – captar, cadastrar e oferecer aos desempregados e aos trabalhadores em situação de rua vagas para reinserção no mercado de trabalho;

II – captar, cadastrar e encaminhar pessoas em situação de rua para vagas de qualificação profissional;

III – garantir acesso das pessoas em situação de rua ao Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e ao Sistema Nacional de Emprego (Sine);

IV – facilitar e auxiliar a emissão de segunda via de documentos como Registro Geral (RG), certidão de nascimento e certidão de casamento, bem como o registro no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), para pessoas em situação de rua;

V – facilitar a emissão de Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) para pessoas em situação de rua;

VI – prestar os serviços de orientação trabalhista e previdenciária às pessoas em situação de rua;

VII – prestar informação, assessoria e orientação aos empregadores sobre as necessidades de apoio e de adaptações do ambiente de trabalho ao trabalhador em situação de rua;

VIII – realizar ações de apoio às pessoas em situação de rua nos postos de trabalho, na formação ou treinamento, no desenvolvimento de habilidades socioemocionais e relacionais e no acompanhamento do processo de inserção e continuidade no ambiente de trabalho, conforme a necessidade individualizada de cada trabalhador em situação de rua;

IX – indicar para o órgão público gestor possíveis beneficiários das Bolsas de Qualificação para o Trabalho e Ensino da População em Situação de Rua (Bolsas QualisRua), de que trata o caput do art. 12 desta Lei.

§ 1º Os CatRua serão compostos de equipes multidisciplinares que tenham condições, qualificação e número de trabalhadores suficientes para a realização das ações previstas no caput deste artigo.

§ 2º O acompanhamento do trabalhador em situação de rua deverá englobar o momento prévio à sua contratação, a inserção e adaptação no posto de trabalho e a realocação em caso de perda do vínculo empregatício.

§ 3º Para efetivar o acompanhamento personalizado do trabalhador em situação de rua, os CatRua deverão construir plano individual profissional que respeite o perfil profissional do trabalhador em situação de rua e observe o seu grau subjetivo de dificuldade de adaptação ao mercado de trabalho, adequando a intensidade dos apoios oferecidos.

§ 4º Os CatRua deverão, em articulação com os serviços socioassistenciais, realizar busca ativa de trabalhadores em situação de rua que estejam em logradouros públicos, por meio de ações itinerantes realizadas no território de forma contínua e articulada com a rede socioassistencial.

§ 5º Sempre que possível, as ações territoriais dos CatRua serão realizadas de forma integrada com as equipes dos Serviços Especializados em Abordagem Social (Seas) e dos Consultórios na Rua (CnR).

§ 6º O poder público deverá construir fluxos para integrar as bases de dados relativas aos serviços do Sistema Único de Assistência Social (Suas) e do Sistema Único de Saúde (SUS) que atendam pessoas em situação de rua, de forma a subsidiar o trabalho dos CatRua, observado o devido respeito à privacidade das pessoas e das famílias, na forma das Leis nºs 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Lei de Acesso à Informação), e 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).

Art. 8º Os entes federativos poderão instituir o Programa Selo Amigo PopRua, com o objetivo de promover as ações afirmativas específicas da iniciativa privada, a fim de estimular a contratação de pessoas em situação de rua.

Art. 9º Os equipamentos do Suas deverão adotar as ações necessárias para garantir o acesso das pessoas em situação de rua ao mercado de trabalho, consideradas suas especificidades e diversidade.

Parágrafo único. Os serviços da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) deverão integrar as ações de reabilitação psicossocial às iniciativas de fomento ao empreendedorismo e ao cooperativismo social orientadas por esta Lei.

Art. 10. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para garantir a inclusão de adolescentes e jovens, com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos, conforme a Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013 (Estatuto da Juventude), em situação de rua, nos programas de aprendizagem, de qualificação profissional e de inserção segura no mercado de trabalho.

§ 1º A PNTC PopRua deverá adotar medidas para incentivar as empresas vencedoras de licitações públicas a priorizar a contratação de aprendizes adolescentes, com idade entre 14 (quatorze) e 18 (dezoito) anos, em situação de rua.

§ 2º As crianças e os adolescentes com as idades previstas no art. 2º da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), em situação de rua identificados em situação de trabalho infantil deverão ser incluídos no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti).

Art. 11. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para ofertar permanentemente cursos para a população em situação de rua com o objetivo de promover gradativamente o direito dos trabalhadores em situação de rua à capacitação, à profissionalização e à qualificação e requalificação profissional.

§ 1º Os cursos referidos no caput deste artigo deverão observar:

I – o trabalho como princípio educativo;

II – os saberes acumulados na vida e no trabalho exercidos nas ruas;

III – a efetividade social e a qualidade pedagógica das suas ações;

IV – a integração com políticas de emprego, de trabalho, de renda, de educação, de ciência e tecnologia, de saúde mental, de juventude, de inclusão social e de desenvolvimento, entre outras.

§ 2º Para efetivar o acesso de pessoas em situação de rua aos cursos de qualificação profissional, o poder público deverá criar modalidades especificamente destinadas à capacitação profissional desse público, inclusive políticas de gratuidade.

Art. 12. O poder público, em todas as esferas federativas que aderirem à PNTC PopRua, deverá instituir bolsas de incentivo financeiro às pessoas em situação de rua participantes de cursos de qualificação profissional e que busquem a elevação de sua escolaridade, denominadas Bolsas de Qualificação para o Trabalho e Ensino da População em Situação de Rua (Bolsas QualisRua).

§ 1º As Bolsas QualisRua consistirão em política de transferência de renda condicionada à realização de atividades de qualificação, de capacitação, de formação profissional e de elevação da escolaridade, e terão como objetivo conceder atenção especial ao trabalhador e ao estudante em situação de rua, de forma a garantir condições para sua permanência nos ambientes de aprendizado.

§ 2º O recebimento das Bolsas QualisRua durante o exercício das atividades descritas no § 1º deste artigo pelos beneficiários da PNTC PopRua será cumulativo e não impedirá nem suspenderá o recebimento de benefícios de outros programas de transferência de renda e de auxílios de quaisquer entes federativos.

§ 3º As Bolsas QualisRua poderão ser vinculadas ao exercício, por seus beneficiários, de atividades e capacitação ocupacional realizadas e ministradas diretamente por órgãos públicos da administração pública direta ou indireta ou por entidades conveniadas ou parceiras, vedada qualquer atividade insalubre, nos termos das normas trabalhistas vigentes.

§ 4º As Bolsas QualisRua deverão possibilitar a permanência da pessoa em situação de rua no ambiente de aprendizado ou capacitação profissional, bem como subsidiar despesas de alimentação e de deslocamento relacionadas às atividades dos cursos, capacitações e ambiente escolar.

§ 5º Os critérios de concessão, de vigência e de interrupção das Bolsas QualisRua serão estipulados em decreto regulamentador.

§ 6º Para garantir a permanência de pessoas em situação de rua em cursos de qualificação profissional, a PNTC PopRua deverá criar condições para oferecer auxílios financeiros na forma desta Lei, sem prejuízo de outras bolsas e auxílios disponíveis.

Art. 13. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para o acesso da população em situação de rua à educação escolar, em todas as etapas e modalidades da educação básica, e promover o acesso dessa população à educação superior, respeitadas suas especificidades, com vistas à superação da situação de rua.

§ 1º As pessoas em situação de rua deverão ser incorporadas preferencialmente na rede pública de educação, evitada sua segregação.

§ 2º Em atenção à realidade das pessoas em situação de rua, deverá ser a elas assegurado o direito à matrícula e à permanência nas escolas e nas instituições de ensino superior, com a flexibilização da exigência de documentos pessoais e sem a exigência de comprovantes de residência em qualquer época do ano.

§ 3º Os entes federativos deverão realizar campanhas de forma contínua nos equipamentos que atendem pessoas em situação de rua com o objetivo de divulgar informações necessárias, como os documentos solicitados para a efetivação de matrículas, o calendário letivo, a localização das escolas e o processo de transferência escolar.

§ 4º Deverá ser viabilizada a formação continuada de docentes, de gestores e de demais integrantes do corpo técnico-pedagógico da rede educacional sobre as especificidades da população em situação de rua, as políticas públicas e os direitos dessas pessoas.

§ 5º A PNTC PopRua deverá estimular os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a oferecer, nas regiões centrais das cidades, escolas que atendam às necessidades educacionais específicas das pessoas em situação de rua.

Art. 14. A União deverá elaborar diretrizes nacionais com o objetivo de qualificar a oferta da política educacional para a população em situação de rua.

§ 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar diretrizes específicas para atendimento da escolarização da população em situação de rua.

§ 2º A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para garantir a participação das pessoas em situação de rua e dos comitês intersetoriais de monitoramento de políticas públicas para a população em situação de rua em todas as etapas de formulação das diretrizes previstas neste artigo e dos processos educacionais correlatos.

Art. 15. O Estado e as instituições de ensino deverão prestar acompanhamento pedagógico e assistência estudantil às pessoas em situação de rua e deverão considerar:

I – a situação social, educacional, de trabalho, de moradia e de saúde da população em situação de rua;

II – o acompanhamento transversal por profissionais de psicologia e serviço social;

III – a oferta gratuita de espaço para a guarda segura de objetos pessoais, material escolar, vestuário, produtos de higiene, espaço adequado para banhos e demais práticas ligadas à higienização pessoal, alojamento estudantil, transporte e alimentação escolar que atenda às necessidades nutricionais dos estudantes em situação de rua;

IV – a adaptação dos projetos político-pedagógicos, do currículo, dos tempos, dos ritmos e dos espaços escolares à realidade das pessoas em situação de rua.

Parágrafo único. A assistência estudantil deverá ocorrer de forma articulada com a rede socioassistencial e com as demais políticas públicas e contemplar busca ativa e acompanhamento sistemático, inclusive das famílias das pessoas em situação de rua.

Art. 16. Os entes federativos deverão promover o acesso das pessoas em situação de rua à educação superior, notadamente nas instituições públicas.

§ 1º Deverão ser implementados programas de acesso, permanência e assistência estudantil à educação superior para as pessoas em situação de rua, de forma a assegurar-lhes meios que permitam a conclusão dos cursos por elas escolhidos.

§ 2º As instituições de educação superior deverão garantir às pessoas em situação de rua acesso aos seus cursos extracurriculares e projetos de pesquisa e extensão universitária, bem como assegurar sua permanência nesses cursos e projetos.

Art. 17. Os serviços do Suas deverão atuar de forma integrada com a política de educação para garantir o direito à educação da população em situação de rua, considerados o seu ingresso e a sua permanência nas instituições de ensino.

Art. 18. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possam garantir prioridade de vagas nas instituições públicas de educação infantil e nas escolas públicas de tempo integral dos ensinos fundamental e médio para crianças e adolescentes integrantes de famílias em situação de rua.

§ 1º A PNTC PopRua deverá estimular os entes federativos a criar mecanismos para garantir o acesso de mães adolescentes em situação de rua à educação, sobretudo aos ensinos fundamental e médio e aos programas de extensão educacional ou correlatos direcionados para a sua faixa etária.

§ 2º Para garantia do direito à educação da população em situação de rua, os equipamentos e as estratégias da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) deverão, no caso de encaminhamento de uma pessoa em situação de rua para serviço da Raps de outro território, assegurar a transferência de matrícula na instituição de ensino perante os órgãos competentes, respeitada a proximidade geográfica.

§ 3º Os adolescentes em situação de rua deverão ser considerados público prioritário para fins de inclusão no Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem).

Art. 19. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para garantir políticas de inclusão digital direcionadas a pessoas em situação de rua, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente por meio de telecentros, bem como para promover o acesso dessa população aos espaços e equipamentos públicos.

Art. 20. A inserção de pessoas em situação de rua em postos de trabalho, em cursos de qualificação, em instituições de ensino, nas Bolsas QualisRua e em outros instrumentos da PNTC PopRua obriga o poder público a disponibilizar, imediatamente e de forma simultânea, vagas nas instituições públicas de educação infantil e nas escolas públicas de tempo integral dos ensinos fundamental e médio para crianças e adolescentes que compõem o núcleo familiar do beneficiário, caso seja o responsável pelo exercício da parentalidade.

Art. 21. A PNTC PopRua deverá garantir o acesso imediato à moradia dos beneficiários, por meio de políticas de habitação ou por programas específicos para a população em situação de rua, com o objetivo de promover a sustentabilidade do acesso ao trabalho, respeitadas a autonomia e a autodeterminação da pessoa em situação de rua.

§ 1º No caso de impossibilidade de atender imediatamente ao disposto no caput deste artigo, o poder público, de forma subsidiária e provisória, deverá garantir às pessoas em situação de rua e a seus núcleos familiares vagas fixas na rede socioassistencial, preferencialmente em modalidades de acolhimento provisório mais autônomas e privativas.

§ 2º O acolhimento provisório descrito no § 1º deste artigo deverá ser vinculado ao atendimento futuro do beneficiário em políticas públicas de acesso à moradia.

Art. 22. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve garantir celeridade e prioridade na análise dos processos das pessoas em situação de rua, bem como facilitar o acesso dessa população aos requerimentos de aposentadoria, de pensões e de benefícios, sem condicionamento das solicitações à apresentação de comprovante de residência.

Parágrafo único. Para facilitar o acesso da população em situação de rua aos requerimentos referidos no caput deste artigo, o INSS poderá realizar ações itinerantes nos territórios com grande concentração de pessoas em situação de rua.

Art. 23. A população em situação de rua será priorizada no processo de implementação gradativa da renda básica de cidadania, nos termos da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004.

Art. 24. A PNTC PopRua promoverá programas de inclusão social e produtiva que tenham a população em situação de rua como público-alvo prioritário, incluída modalidade especificamente direcionada à população em situação de rua.

§ 1º O Estado deverá priorizar a aquisição de produtos elaborados e serviços prestados diretamente pelas pessoas em situação de rua, bem como incentivar projetos que promovam a aquisição de produtos elaborados pelas pessoas em situação de rua.

§ 2º Os entes federativos que aderirem à PNTC PopRua deverão promover o acesso das iniciativas de economia solidária da população em situação de rua a instrumentos de fomento, a linhas de microcrédito, a meios de produção e a mercados, bem como a conhecimento e formação nas tecnologias sociais necessárias ao seu desenvolvimento.

Art. 25. Os entes federativos que aderirem à PNTC PopRua deverão implementar incubadoras sociais destinadas à população em situação de rua como estratégia para fomentar o cooperativismo dos grupos de pessoas em situação de rua, com base no modelo de organização da economia solidária e com foco na autonomia e na autogestão.

§ 1º As incubadoras sociais deverão garantir as condições de trabalho, o espaço físico e os equipamentos necessários ao desenvolvimento dos projetos solidários da população em situação de rua.

§ 2º Deverão ser oferecidas formações às pessoas em situação de rua, a fim de estimular a organização pessoal e a socialização, por meio de atividades coletivas, e de apoiar o processo de retomada dos vínculos interpessoais, familiares e comunitários, com vistas à geração de renda.

§ 3º As incubadoras sociais deverão propor ações de formação e capacitação em cooperativismo e em associativismo social para técnicos e gestores que atuem com pessoas em situação de rua.

§ 4º As incubadoras sociais deverão disponibilizar recursos e formação para o desenvolvimento de artistas em situação de rua, de forma a facilitar o seu acesso à renda por meio de atividades culturais.

Art. 26. As cooperativas sociais formadas por pessoas em situação de rua ou a elas direcionadas deverão organizar o trabalho dessas pessoas, especialmente quanto a instalações, horários e jornadas, a fim de minimizar as suas dificuldades gerais e individuais, bem como deverão desenvolver e executar programas especiais de treinamento com o objetivo de aumentar sua produtividade e independência econômica e social.

Art. 27. A PNTC PopRua deverá promover projetos de inclusão de catadores de materiais recicláveis, conforme previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, e na Política Federal de Saneamento Básico, cujas diretrizes estão estabelecidas na Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007.

Parágrafo único. Serão utilizados os seguintes instrumentos para garantir as estratégias relacionadas ao cooperativismo social:

I – programas de formação continuada que atendam às necessidades dos trabalhadores das cooperativas sociais e dos empreendimentos econômicos solidários sociais;

II – oferta de padrões tecnológicos e gerenciais para a condução de suas atividades;

III – capacitação tecnológica e gerencial de pessoas em situação de desvantagem que desejem ingressar ou formar cooperativas sociais ou empreendimentos econômicos solidários sociais;

IV – linhas de crédito existentes ou a serem criadas, nos termos da lei;

V – abertura de canais de comercialização de produtos e serviços, que possibilitem o acesso das cooperativas sociais e dos empreendimentos econômicos solidários sociais às compras públicas;

VI – transferência de recursos, nos termos da legislação vigente.

Art. 28. A PNTC PopRua deverá criar mecanismos para garantir, em todas as esferas federativas, a profissionalização, a formação e o fomento de artistas em situação de rua, de modo a assegurar o seu acesso à renda por meio das atividades culturais e da visibilidade do seu trabalho como forma de saída das ruas.

Art. 29. O Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para a População em Situação de Rua (Ciamp Rua), por meio de grupo de trabalho específico, será responsável pelo contínuo acompanhamento e pela construção de diretrizes para implementação, monitoramento e aperfeiçoamento da PNTC PopRua.

Parágrafo único. A participação social nos demais entes federativos que aderirem à PNTC PopRua será assegurada por meio dos comitês intersetoriais de monitoramento de políticas públicas para a população em situação de rua locais, com participação direta de pessoas em situação de rua.

Art. 30. A PNTC PopRua deverá estimular a constituição de grupos de trabalho interfederativos destinados ao mapeamento e levantamento das demandas educacionais e de trabalho das pessoas em situação de rua.

Parágrafo único. Serão considerados, para o aperfeiçoamento e a avaliação da PNTC PopRua, dados censitários nacionais e locais periódicos sobre a população em situação de rua.

Art. 31. A PNTC PopRua deverá criar fluxos de trabalho específicos com os órgãos de fiscalização entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, a fim de garantir o cumprimento desta Lei, de combater as violações de direitos e de promover o trabalho decente de pessoas em situação de rua, especialmente por meio da efetivação de seus direitos trabalhistas e previdenciários.

Art. 32. A PNTC PopRua deverá fomentar e divulgar pesquisas, projetos de extensão e produção de conhecimento sobre metodologias e tecnologias de qualificação social e profissional destinadas à inclusão social e produtiva da população em situação de rua nas instituições de educação superior, nas redes de educação básica e nos setores que atuam diretamente com a população em situação de rua, com incentivo a pesquisas participativas integradas por pessoas em situação de rua.

Parágrafo único. Serão consideradas iniciativas de interesse para o fomento e a divulgação referidos no caput deste artigo, entre outras, aquelas que:

I – abarquem projetos que auxiliem na identificação e no desenvolvimento de metodologias e tecnologias de qualificação social e profissional da população em situação de rua;

II – promovam o desenvolvimento de abordagens inovadoras e a formulação de soluções criativas para os problemas práticos da qualificação social e profissional de pessoas em situação de rua;

III – favoreçam o desenvolvimento de experiências de democratização e ampliação do controle social sobre as políticas públicas de qualificação profissional para pessoas em situação de rua.

Art. 33. A PNTC PopRua deverá garantir a produção e a ampla divulgação de indicadores das ações de inclusão das pessoas em situação de rua a partir da PNTC PopRua, assegurada a transparência dos dados.

Art. 34. A PNTC PopRua deverá garantir campanhas de sensibilização e de engajamento nas agências de contratação e no setor privado, com vistas à capacitação, ao emprego e à inclusão de pessoas com histórico de situação de rua, por meio da adoção de medidas que possam minimizar as barreiras institucionais, tais como não considerar o uso de endereço como critério de eliminação na seleção do profissional.

Art. 35. A PNTC PopRua deverá ser implementada de forma descentralizada e articulada entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que a ela aderirem por meio de instrumento próprio.

§ 1º O instrumento de adesão à PNTC PopRua definirá as atribuições e as responsabilidades a serem compartilhadas.

§ 2º Os entes federativos que aderirem à PNTC PopRua deverão priorizar o cadastramento de pessoas em situação de rua no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), de que trata o art. 6º-F da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, por meio de encaminhamento ao Suas, na forma do regulamento.

Art. 36. A regulamentação da operacionalização da PNTC PopRua, conforme disponibilidade orçamentária e financeira, será definida em ato do Poder Executivo federal, em articulação com o Ciamp Rua.

Art. 37. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 16 de janeiro de 2024; 203º da Independência e 136º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Silvio Luiz de Almeida
Camilo Sobreira de Santana
Anielle Francisco da Silva
Flávio Dino de Castro e Costa
Swedenberger do Nascimento Barbosa

Precisamos de você, doe agora